terça-feira, 31 de março de 2015

“Que lindos olhos azuis você tem!”

Estava na manicure quando entrou uma garotinha loirinha, de olhos azuis, com sua mãe; ela aparentava ter uns cinco anos de idade. A atendente verbalizou a frase do título, mas a menina ficou quieta e não falou nada. A mãe, então, verbalizou: “Gabriela, diz obrigada para a moça!” A menina respondeu: “Já estou cansada de ouvir isto!” A mãe ficou sem graça e repreendeu a menina falando-lhe para que pedisse desculpas à manicure, que era muito feio falar assim em público, enfim, fez um sermão danado na frente de todos. A menina continuou quieta e a mãe, diante do silêncio da filha, acabou por pedir desculpas à profissional, e ainda ameaçou a menina dizendo em tom áspero: ”Lá em casa nós conversamos!”

Nesta cena me dei conta de quanto nós, adultos, invadimos as crianças com as nossas falas e acabamos mexendo com as mesmas sem que elas queiram; depois, quando essas crianças se mantém alheias às solicitações que fazemos, ou quando nos respondem de uma maneira que consideramos inadequada, acabamos por considerá-las culpadas e, então, usamos de ameaças por terem realizado tamanha façanha.


Vejam só: quem “provocou” a garota foi alguém que não é do seu convívio. Então, por que ela precisaria agradecer à pessoa desconhecida? Outra coisa: quantas vezes ela já deve ter ouvido, por parte de pessoas desconhecidas, que é linda com aqueles olhos azuis, quando, na verdade, ela gostaria de ouvir a mesma frase elogiosa por parte de alguém de sua família, alguém realmente próximo a ela afetivamente? Poderíamos pensar, por exemplo, que ela herdou os olhos azuis de sua mãe e que, por litígio de separação do casal, o pai ─ que talvez não tenha os mesmos belos olhos azuis─ não teça nenhum tipo de elogio a esse traço genético para não reforçar essa semelhança com sua ex-mulher? Penso que muitos adultos provocam as crianças sem necessidade e quando elas não gostam, ou não compartilham da situação em questão, ainda são obrigadas a serem simpáticas? Pode isto?

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